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Anjo Bom | Capítulo Especial: Eleonor&Toni


Web Novela de Everton B Dutra


“Esta é uma obra de ficção coletiva baseada na livre criação artística e sem compromisso com a realidade”.

01 INT. MANSÃO DELLAFRANCO, SALÃO DE FESTAS – DIA.

Letreiro: 1954, SP, Brasil.

CAM. Foca no rosto de TONI (27), inexpressivo. A câmera vai se afastando, revelando o trânsito de várias pessoas. Ele afrouxa o colarinho do terno que usa e segue andando em direção a porta de saída do salão.

Abre a porta, suando frio. Subitamente, uma mulher dá para frente, como se fosse abrir a porta no mesmo momento que Toni. ELEONOR (25) olha Toni, com os olhos arregalados e a boca semiaberta, ressaltando sua cutes carregada no blush.

DESTINO (V.O) 一 O sol no jardim estava esplêndido neste dia. Ah, como é bom enxergar o amor em todas as suas cores. Nesse exato momento, Toni Dellafranco enxergava, cores que ele nunca vira em sua vida inteira, em tons de paixão, com suaves nuances de coração acelerado. Nunca seu rosto ganhou tantas expressões como ganhou hoje, ao passo que a adorável Eleonor pendia entre permanecer vidrada no homem mais bonito que já viu na vida, ou arrancar os sapatos que estavam apertando seus pés. Eu não pretendo me demorar nas descrições, mas histórias de amor sempre me fazem pedir um favor ao tempo; que ele passe devagando, que é para eu não me acostumar com minha imprevisibilidade.

ELEONOR 一 Desculpe, eu só estava…

TONI 一 Você me lembra a Audrey Hepburn.

Eleonor engoliu em seco. Jamais uma lavadeira como ela tinha tamanho lisonjeiro. Rubrou. CAM. Foco em Eleonor. Ela abaixa os olhos, envergonhada.

ELEONOR 一 Desculpe, eu vou indo.

CAM. Eleanor se apressa. CAM a acompanha. Ela vai descendo as escadas rapidamente. Apressado, Toni fecha a porta do salão, atrás de si, e segue, atrapalhado, a seguindo. MOVIMENTO DOS DOIS.

TONI 一 Onde está indo?

ELEONOR 一 Receio que não lhe devo satisfações, senhor.

TONI 一 Pois me parece que estavas na boca de espera de algo.

ELEONOR 一 Engano seu. Estava apenas a marcar touca e, sem querer, vim parar aqui.

TONI 一 Sem mais, nem menos?

ELEONOR 一 Sem mais, nem menos!

TONI 一 Ora… pois saiba que eu não acredito!

ELEONOR 一 Estas a me chamar de mentirosa?

TONI 一 Estou!

ELEONOR 一 Bulhufas! Diz-me o senhor, porque mesmo com minhas explicações continua me seguindo.

TONI 一 Tudo que me disse até não foram nada mais do que papo furado!

Eleonor para de andar, afobada e se vira para Toni.

ELEONOR 一 Como se atreve?

TONI 一 Caso não me diga a verdade, se verá numa situação de lascar o cano, isso lhe garanto.

ELEONOR 一 Pois, eu duvide-o-dó!

TONI 一 Então, prove!

Eleonor, ofendida e encurralada, acaba dando uma bofetada no rosto de Toni, que arregala os olhos, surpreso. CAM em Eleonor, ofegante, ela confessa:

ELEONOR 一 Sou lavadeira. Peguei essas roupas emprestadas de uma cliente e me passei por convidada da festa.

TONI 一 Com a finalidade de quê?

ELEONOR 一 Soube que Linda Batista está aqui e queria muito ouvi-la cantar. Por favor, não me denuncie. Eu vou embora e esquecemos tudo isso.

CAM em Toni. Ele a olha, com desconfiança. Toni olha para baixo. Foco em Eleonor, que também olha para baixo. Revela Toni, com a mão estendida para a moça. Volta. Ele sorri.

TONI 一 Venha comigo. Meu pau é anfitrião da festa. Digo que você é uma amiga minha.

Eleonor sorri.

CORTA PARA:

02 INT. MANSÃO DELLAFRANCO, SALÃO DE FESTAS – DIA.

CAM. Salão de festas. Pessoas muito bem vestidas. Todas reunidas, juntas, enquanto a cantora LINDA BATISTA, se encontra no meio do salão. Foco. Uma pessoa toca um piano, enquanto ela canta a todo pulmão.

LINDA BATISTA (canta) 一 Risque

Meu nome do seu caderno,

Pois não suporto o inferno

Do nosso amor fracassado!

Deixe

Que eu siga novos caminhos

Em busca de outros carinhos

Matemos nosso passado.

PLANO. Foco em Eleonor, com uma taça nas mãos, vidrada em Linda; suspirante, com os olhos brilhando. Ao lado, Toni, com as mãos nos bolsos. Ele olha para Eleonor, afável. DESFOQUE. Logo percebemos um terceiro personagem na cena. HENRIQUETA (25) observa Toni, severa, com um ódio no olhar. Bebe de uma vez sua taça.

Linda acaba de cantar e todos a aplaudem. Eleonor com mais empolgação e emoção.

CAM em Henriqueta, que chega, altiva, onde Toni e Eleonor estão.

HENRIQUETA — Não vai me apresentar, Toni?

Toni olha para Henriqueta e fecha a cara. Eleonor, intimidada, olha para Toni e depois para Eleonor, mordiscando o lábio.

TONI — Esta é Eleonor, uma amiga que muito estimo.

Em Eleonor, observando Eleonor de cima a baixo.

HENRIQUETA — Nunca soube dessa sua amiga, Toni. Não me tomes por tonta, sei muito bem de que se trata de uma rameira, dessas que todo homem busca para afogar as mãos, mas você foi um pouco mais longe. Se a querias presentear com um vestido meu, por que não vieste tu mesmo me pedir este favor?

CAM. Em Toni e Eleonor, surpresos.

TONI — Por favor, Henriqueta. Sem chiliques aqui. Respeite Eleonor, ela não é nada disso do que dizes. Não por menos, deste vestido há um monte semelhante feito por qualquer modista deste país.

HENRIQUETA — Não acredito. Enviei a lavadeira há dois dias, junto com outros muitos. Parece que caçoa da minha inteligência. Como podes me lastimar dessa maneira?

ELEONOR — Desculpe. Eu vou embora.

Eleonor olha, com a raiva contida, para Henriqueta. Em seguida se vai.

TONI — Espere!

Toni faz para ir atrás de Eleonor, mas Henriqueta o segura.

HENRIQUETA — Toni! Para ela tens sorrisos de sobra. Para mim, nem sequer se dá ao trabalho de enrugar a testa. Logo, eu, Toni. Eu! Em breve vamos nos casar. Esqueceu disso?

Toni puxa o braço, com raiva, e segue atrás de Eleonor. Em Henriqueta, furiosa.

CORTE IMEDIATO PARA:

03 EXT. MANSÃO DELLAFRANCO, JARDIM – DIA.

CAM. PLANO GERAL pelo vasto jardim. Eleonor caminha o mais rápido que pode. Segue Toni, logo atrás, tentando alcançá-la.

TONI — Por favor, espere!

ELEONOR — Não há nada que esperar.

TONI — A senhorita é uma baita de carne de pescoço!

Toni alcança Eleonor e a detém, segurando seu braço. Ele sorri, divertindo-se.

TONI — Pedi para aguardar!

ELEONOR — E o senhor é um chato de galochas! Vá dar ordens ao seus, a mim, não!

Os dois se encaram ardentemente. Toni, com um semblante sofrido, olha diretamente para os lábios de Eleonor, mesmo sem querer, enquanto ela engole em seco, com o coração palpitando.

ELEONOR — Conheceu mesmo?

TONI (bobo) — A quem?

ELEONOR — Audrey Hepburn.

Toni sorri. O sol ilumina seu rosto e olhos.

TONI — Uma vez, em Moulin Rouge.

04 EXT. MANSÃO DELLAFRANCO, QUARTO – NOITE.

CAM DESFOCADA.

Vai se revelando, nos imediatando de uma cena de discussão fervorosa. Henriqueta e Toni. Ela briga, desesperada, enquanto ele, de saco cheio, esfrega a cabeça e caminha de um lado para outro. CAM acompanha o movimento dos dois.

HENRIQUETA — Sei bem o que querias com aquela lavadeira! Me deixou plantada na festa, no meio de todo mundo, com cara de tonta, que pra você eu sei que é isso que sou! Admito que sou tonta, Toni, tonta! Pois somente uma tonta como eu para aturar sua indiferença, sua frieza! Mas, não se queixe, que remorso é um sentimento que sei que não sentes! Não pensa em mim sequer um minuto?

TONI — Henriqueta, por favor!

HENRIQUETA — Quando vais dormir, ou quando ao menos não fazes nada, pensas em mim? Se sim, como? De que modo?

Henriqueta chega perto de Toni, desesperada e calorosa. Ela agarra seu rosto e o olha no fundo dos olhos.

HENRIQUETA — Diz! Arranca logo o que anda doendo dentro de mim, e confessa…

TONI — Não sei o que quer que eu confesse…

HENRIQUETA — Se me tens amor…

TONI — De novo essa história…

HENRIQUETA — Se sou a mulher a quem domina seus pensamentos quando colocas a cabeça no travesseiro a noite, que perde a noção do tempo quando olhas para mim e o fôlego quando tocas as minhas mãos, e mais ainda, se quando me beijas sente seu corpo arder como brasas em chamas….

TONI — Não quero lhe magoar, Henriqueta, por favor…

HENRIQUETA — Apenas diga se ama ou não!

TONI — Não amo!

Toni grita. Henriqueta se afasta, chocada, respirando ofegante. Breves momentos de silêncio se fazem entre os dois. Toni engole.

TONI — Não amo. Não sinto nada além do que profunda admiração e respeito. Não faço nada além de seguir uma obrigação de um casamento por conveniência, os desmandos de meu pai… Eu sinto muito.

Em Toni, com um semblante sofrível. Abaixa os olhos e vai embora do quarto.

Em Henriqueta, que começa a chorar, faltando-lhe o ar. Ela caminha, a custo, pelo quarto, esfregando o colar de pérolas em seu pescoço. Enfurecida, ela arranca o colar de seu pescoço.

As pérolas todas caem no chão. CAM. Henriqueta grita, enfurecida, rasgando a garganta, num grito atemorizante, por um longo tempo.

CAM vai se afastando, abandonando a cena.

05 INT. CIRCO – NOITE.

Categórico que houve um pequeno intervalo de tempo entre a noite da cena anterior a esta.

CAM. PLANO AÉREO. FOCO em CÂMERA LENTA nos rostos de Eleonor e Toni. Toni, divertido, olha para cima, aplaudindo. Eleonor, encantada, extasiada, com os olhos brilhantes, também olha para cima, enquanto aplaude.

FOCO MUDA. Movimentos rápidos dos acrobatas, equilibrando-se numa acorda, saltitando de um lado para o outro em cortinas, belíssimas bailarinas dançam graciosamente embaixo, despertando a euforia do público, que levantam-se a aplaudir de pé o show realizado.

06 EXT. PARQUE – NOITE.

Eleonor e Toni seguem andando. Toni, com as mãos nos bolsos da calça, enquanto Eleonor a manter-se calada, segura um pequeno saco de pipoca, comendo-a.

Ele a olha, discretamente.

TONI — já foi ao cinema?

ELEONOR — Uma vez. Assisti o Cangaceiro. Fiquei assustada! Nunca tinha visto algo tão real numa tela grande, sabe?

TONI — Eu pagaria pra ver a sua cara se visse a TV em cores.

ELEONOR (curiosa) — TV em cores?

TONI — Sim.

ELEONOR — Enxergar tudo assim do jeito que a gente enxerga?

TONI — Assisti a TV em cores em minha viagem recente aos Estados Unidos. É encantador.

Eleonor abre um sorriso rasga-rosto, e faz com que Toni também

ELEONOR — Imagina só! Só mesmo os ricos e playboys como você que podem ter esse tipo de coisa. Eu, no máximo, fico suspirando feito uma tola com as radionovelas até tarde da noite.

TONI — Onde você mora, Ele?

ELEONOR — Numa pequena vila. Aliás, vai haver uma festa, com música, samba, vai ser divertido!

TONI — Posso ir?

ELEONOR — Você?

TONI (debocha) — Por que? Tem medo que eu manche meu terno caríssimo andando pelos subúrbios da cidade?

ELEONOR — Eu sou lavadeira, esqueceu? Se manchasse, eu daria um jeito rapidinho. Você sobreviveria a isso, só não sei se conseguiria se manter calmo se seu cabelo lambido bagunçasse.

Toni protege os cabelos com as mãos e faz cara de medo, brincalhão. Eleonor ri e joga pipoca nele.

Os dois passam pela câmera. TRANSIÇÃO DE CENA PARA:

07 INT. MODISTA – DIA.

Foco em Henriqueta, frente ao espelho da loja de roupas. Ela se olha fixamente e põe uma mecha de cabelo atrás da orelha.

MARTA — Filha, o que você acha desse…

FLASHBACK ON.

Som de porta se abrindo e fechando.

Revela um quarto grande e iluminado. É dia. As finas cortinas da porta que dá para a sacada da casa, se movem lentamente com o bater do vento. Som de passos.

CAM foca na mesinha do quarto, bagunçada. Repleta de papéis espalhados, canetas, lápis, abajur e um copo de whisky. No centro, um desenho, uma caricatura crua do rosto de Eleonor, assinado por Toni logo abaixo do papel amarelado.

O desenho é agarrado por uma mão trêmula. CAM. Revela o rosto de Henriqueta, triste, enquanto olha o desenho, com lágrimas retidas nos olhos. Ela segura o desenho contra o peito, amassado-o um pouco até, em profunda agonia.

Volta a focar na caricatura de Eleonor. Ela arranca a borda do papel com a assinatura de Toni. E deixa o desenho onde estava. Sons de passos. Porta abrindo e abrindo.

FLASHBACK OFF.

VOLTA.

Henriqueta ainda se olhando no espelho, perdida. Ela toca os lábios levemente.

MARTA — Henriqueta, minha filha? Onde anda com a cabeça?

Henriqueta desperta de seus pensamentos.

HENRIQUETA — Desculpe… pensava no casamento. Toni está estranho ultimamente. Desconfio que ele anda se engraçando com umazinha. Ele não me ama, mamãe.

MARTA — Oh, querida. Verás que o amor dá e passa, assim como o dele por ti, o seu também passará.

HENRIQUETA — Não sei se um dia ele me amou. É capaz dele me largar para pedir a mão daquela lavanderia suja.

MARTA (preocupada) — Sabes quem é?

HENRIQUETA — Antes não soubesse! Não me faça falar dela, mamãe. Não sabe a dor que sinto. Não tenho vontade de prosseguir com esse casamento, que Toni deixou evidente ser apenas por conveniência.

MARTA — Não abra mão desse casamento, minha filha. Imagina o que se falará por aí a seu respeito.

HENRIQUETA — Uma mulher não pode desistir sem ser julgada? Não pode amar livremente como os homens?

MARTA — Desde que seja escondida, como um vestido que não lhe serve mais dentro do armário.

HENRIQUETA — O que devo, então, fazer? Acredito que não seremos felizes com esse matrimônio. Ele ama outra, e eu…

MARTA — Você o ama.

HENRIQUETA — É claro. Como poderia querer outra coisa… senão a ele, quem?

Henriqueta volta novamente a se olhar no espelho. Mas abaixa os olhos para o seu próprio reflexo.

MARTA — Falarei com Fabrizio, assim que chegar de viagem… Ora, ele precisa dar um freio nesse pão bolorento do filho dele…

08 INT. VILA – NOITE.

Categórico que houve um pequeno intervalo de tempo entre o dia da cena anterior aos acontecimentos desta.

Vila iluminada, enfeitada. Gente de toda a raça, de toda a cor, crianças e adultos dançam no embalo da música; riem e cantam, numa roda composta por todas as pessoas do pequeno local mal cuidado.

CAM foca em Toni, divertindo-se, dançando muito desajustado, enquanto Eleonor se remexe desenvolta, porém ainda tímida. Tomi tira o blazer do terno e o deixa de lado.

Um grupo de crianças passa correndo por entre os dois. Eleonor ri, descompensada. Toni estende a mão para ela.

TONI — Me dê as honras!

Eleonor esconde o rosto, envergonhada, mas aceita, e ele a gira no ar. Depois de alguns minutos, a música de SONOPLASTIA é trocada para: Deixa Comigo, de Carmen Miranda.

Uma canção para se dançar um pouco mais grudado. Grudados, de fato, Eleonor e Toni não estavam, dançam um pouco distantes um do outro.

ELEONOR — Você é muito nisso!

TONI — Só você acha isso. Olha aqui! Olha a manha que eu tenho, vê só.

ELEONOR — Aposto que samba assim não tem Moulin Rouge!

TONI — Nem o samba, nem você.

Eleonor, sem graça, rubra e evita olhar Toni.

ELEANOR — Conheci Carmen Miranda uma vez.

TONI – Jura?

ELEONOR — Sim! Menor, faz muito tempo. Ela veio aqui na vila, dançou, cantou e os jornais nunca souberam disso, e também, se contasse, ninguém acreditaria. Eu lembro como se fosse hoje, eu a vi e tenho certeza que meus olhos ficaram maiores no exato momento. Antes, só tinha visto seu rosto nos jornais, na TV das casas em que eu e minha mãe íamos entregar as roupas. Ela acenou e sorriu pra mim. Eu senti que podia, assim, explodir por dentro!

TONI — E você deixou eu me gabar por ter conhecido a Audrey Hepburn! Me sinto um idiota agora.

ELEONOR — E qual homem não é?

Ela sorri, ele sorri.



09 INT. VILA, CASA DE ELEONOR – NOITE.

CAM. Eleonor ajusta o botão do pequeno rádio, repousado na estante. Som de sintonização. Seu rosto perto da câmera, entretida.

Eleonor olha para Toni e fecha os olhos, se remexendo, sentindo a música, enquanto Toni carrega um tom sério, a observá-la, apaixonado.

CAM. Ele caminha em sua direção. Ela gira no ar, liberta. Toni agarra seu corpo. Eleonor abre os olhos, surpresos. Os dois se entreolham.

TONI — Dance comigo mais uma vez.

ELEONOR — Não, não é certo. Desculpe.

Eleonor se afasta, séria.

TONI — Até pouco tempo estávamos dançando.

ELEONOR — Isso na frente de todos. Mas estamos sozinhos agora, na minha casa. E você tem alguém que espera por você em casa, e que provavelmente está acordada até agora olhando as horas em aflição.

CAM. Foco nos olhos de Toni. Ele os levanta. Foco em sua boca, entreaberta.

TONI (dócil) — E quanto a você, Ele? Tem alguém esperando por você. Por favor, diga que não. Diga que não existe ninguém esperando pelo seu amor.

CAM. Foco nos olhos de Eleonor, com lágrimas retidas nos olhos. Foco em sua boca, molhada. Ela abre e depois fecha. VOLTA o foco em seus olhos. Deixa a lágrima escorrer.

CAM. Toni chega perto de Eleonor, em agonia. Ele encosta sua cabeça na dela, levando sua mão até seu coração. Eleonor arfa, ofegante.

ELEONOR — Por favor, não podemos, Toni…

TONI — Porque, se tiver, eu juro, que saio por aquela porta e te deixo em paz. Eu te poupo de todo o meu amor, mas não posso, escute, não posso te deixar ignorante sobre os meus sentimentos…

ELEONOR — Você vai casar, somos de mundos diferentes.

TONI — Me responda, por favor…

ELEONOR — Não, eu não tenho ninguém.

TONI — Então eu abro mão do meu mundo pra morar no seu com você.

Em Eleonor e Toni, juntos. Ele agarra a sua mão.

TONI — Eleonor Barcellos, você e unicamente você, é o grande…

ELEONOR — Por favor, não. Não diga nada. O que você tem ainda não pode ser meu, e se não for meu, eu não vou ter o que lamentar se o perder.

TONI — Não vai, porque eu não posso perder você. Eu não posso perder você…

10 INT. MANSÃO DELLAFRANCO, QUARTO DE TONI – NOITE.

Toni agarra suas roupas e as põe numa mala de couro em cima da cama.

Ele volta ao guarda-roupas, cantando as coisas, sorrindo.

INTERAÇÃO.

09 INT. VILA, CASA DE ELEONOR – NOITE.

TONI — Me espera aqui. Eu volto.

= = CORTE DESCONTÍNUO = =

VOLTA em Toni, colocando as coisas na mala, desajeitado.

= = CORTE DESCONTÍNUO = =

VOLTA. Eleonor acaba de fechar a porta e se encosta nela. Sorri, emocionada, feliz.

= = CORTE DESCONTÍNUO = =

Toni fecha o zíper da mala. Agarra e vira-se para ir embora, mas se depara com FABRIZIO (52), que acabara de chegar no quarto com mais dois homens.

FABRIZIO — Onde pensa que vai?

Em Toni. Ele engole em seco.

11 EXT. VILA, CASA DE ELEONOR – NOITE.

Um carro acaba de estacionar em frente à vila. CAM. POV. Foco em Eleonor, em frente à janela, aflita.

12 INT. MANSÃO DELLAFRANCO, QUARTO DE TONI – NOITE.

TONI — Embora, inclusive, já estou atrasado. Com sua licença.

Toni passa por Fabrizio, mas é bloqueado pelos dois homens. Ele se volta para o pai.

TONI (assustado) — O que é isso?

Fabrizio ajeita o terno.

FABRIZIO — Marta me contou dos infortúnios que a filha tem passado por conta de sua conduta.

Toni molha os lábios e sorri, indignado.

TONI — O senhor não pode simplesmente…

FABRIZIO — Uma lavadeira. Umazinha que provavelmente é uma caçadora de fortunas!

TONI (raiva) — Não se atreva! Eu não vou permitir que você fale assim dela!

FABRIZIO (fala alto/desdenha) — De quem? FALE! Da Eleonor? Da sua Ele?

TONI — Me deixe passar, meu pai. Eu estou lhe implorando

FABRIZIO — Da Ele! Da Ele! A Lavadeira daquela vila porcalhona, da casa que tem uma janela para uma deplorável vista para o subúrbio desse inferno de cidade!

Toni grita e tenta passar pelos dois homens, lutando para se desprender desesperadamente.

TONI — NÃO! NÃO! ME DEIXA IR!

Os dois homens o arrastam, jogando-o no chão. CAM ACOMPANHA O MOVIMENTO. Toni se debate no chão, enquanto seus pés e corpos são domados pelos homens. Um deles segura sua cabeça contra o chão.

FABRIZIO — Para com isso, Antônio! É ridículo, é patético! Imagina só, deixar a Henriqueta para se juntar com uma Maria Ninguém no fim do mundo! Não foi pra isso que eu te criei.

TONI — Que o senhor me planejou! Porque tudo para você são negócios e dinheiro. Para você tudo que o importa é o poder, o dinheiro!

FABRIZIO — Você e essas suas sentimentalidades!

TONI — Eu a amo. Amo. Por favor, eu estou lhe implorando. Me deixe ao menos dizer isso para ela.

FABRIZIO — Amor é uma coisa que dá e passa.

Foco no rosto de Toni, prensado contra o chão do quarto. Calado, ele chora. Semblante vazio.

TONI — Deve ter sido por isso que a mamãe te deixou, porque talvez o amor seja mesmo passageiro, ou porque talvez é isso que ele resolve ser quando uma pessoa não é merecedora dele.

Em Fabrizio, magoado e raivoso. Ele cerra os dentes.

FABRIZIO — Se chegar perto daquela lavadeira de novo, será a última vez que verá ela viva. Tenha isso em mente.

Fabrizio faz sinal para os homens largarem Toni, e sai andando para fora do quarto.

TONI (rouco/sem forças) — Eu jamais vou perdoá-lo. Pra mim, você morreu.

Fabrizio para no meio do caminho e escuta. Logo depois vai embora.

Foco em Toni, jogado no chão, morto. CAM. Henriqueta aparece na porta do quarto. O PLANO destaca o vão de distância entre os dois. Henriqueta fixa-o, em choque. Toni, no chão, encolhido, com o olhar em sua direção, porém distante. Olhos e rostos vermelhos, como se as veias cheias de sangue de seu rosto fossem explodir.

Henriqueta, assombrada, esconde-se atrás da porta. Abre a boca, respirando fundo. Ela toca sua barriga.

13 INT. VILA, CASA DE ELEONOR – NOITE.

Em Eleonor. Sentada no sofá, de olho na janela, com as luzes todas apagadas.

CAM a rodeia. Suas expressões se foram, como se a alma tivesse sido arrancada em algum momento.

DESTINO — (V.O) Mas, o Tempo… o Tempo… é inimigo de todos. E o Destino é quem causa medo nas pessoas, é o que as impede de fechar os olhos antes de dormir, é o que as fazem tomar decisões sobre continuar, ou desistir. Ora, mas o que o Destino seria sem o tempo? Como ele correria com o tempo? O Destino não sabe de nada, ele não interfere em nada. O Tempo, sim, o Tempo sabe de tudo.

14 EXT. RUA QUALQUER — DIA.

Pessoas transitam de um lado para o outro. Muitas delas. Uma multidão. Pessoas com crianças, com maletas, chiques, não tão arrumadas. Dia iluminado.

Revela, no meio delas, a imagem de Eleonor caminhando.

Em outro ponto da cena, vemos Toni e Henriqueta. Esta, com uma barriga de grávida grande, sorridente, e Toni, sério, carregando algumas sacolas. Ele olha para a barriga de Henriqueta e sorri, cansado.

DESTINO (V.O) — Eu não sei o que falam pra você sobre o Amor. Mas, às vezes eu vejo ele andar por aí, e até onde eu vou, ele está lá. Vai ver o Amor é o real Destino das pessoas. Um dia, eu tive uma conversa franca com o Amor, eu questionei o por quê ele nunca está presente nos casos em que as pessoas mais precisam dele. Eu questionei por que algumas pessoas são vazias de amor e desdenhei na cara dele a sua exclusividade. Eu estava revoltado neste dia. Ele sorriu para mim, o amor, e me disse que ele não escolhe as pessoas, as pessoas que escolhem ele. Eu ri, “mas você não é tão poderoso assim, como dizem”. Eu já vi muitas histórias de amor por aí e posso contar em poucas estrelas quantas delas deram certo. Ele sorriu de novo, e aquilo já estava me deixando irritado. Ele me disse que as pessoas aceitam somente o amor que julgam merecer, e terminou dizendo que, em breve, nos veríamos por aí.

CAM.

Eleonor avista Toni. Ele cruza com seus olhos. Os dois caminham em direções contrárias.

Os dois se encaram por um momento, prendem a respiração e passam, um do lado do outro, como se fossem dois desconhecidos, compartilhando de uma mesma dor, seguindo seus caminhos até se perderem na mesma multidão.

Fim do capítulo.

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